Todo mundo tem uma rotina de vida e eu tabém tenho a minha. Acordar cedo, pegar o metrô e ir a aula, sair da aula pegar metrô e ir almoçar, depois, trabalho. Mas um dia, não sei porque, resolvi acordar cedo, pegar o metrô e ir a aula, sair da aula pegar uma bicicleta e ir almoçar, depois, trabalho.
O tempo nao estava bom, mas eu quis inventar e peguei o velib (bicicletas publicas de Paris) e sai pedalando depois da aula. Sai lendo as placas meio perdido, pois normalmente ando debaixo da terra e não sabia por onde estava indo, fui fazendo o caminho das estações.
Admirado com as novos cantos de Paris, ventinho frio na cara, contente, não notei que uma chuva estava se formando, pois como em São Paulo, o tempo aqui em Paris é meio doido, e derrepente começam a cair os pingos. Bem a contra gosto, tive que estacionar a magrela, afinal tava indo para o trabalho e chegar que nem um pinto molhado não ia ser legal. Entrei na primeira estação do metrô que vi pela frente, Bonne Nouvelle, linha 8. Apesar do horario não ser de pico (11 e 12hs) o metrô estava cheio. Fiquei de pé, uma velhinha de uns 80 anos de um lado, do outro, um adolescente com uma raquete de tênis, espalhados pelo vagão, crianças, mulheres, arabes, africanos...toda a galera parisiense tava la, rumo a proxima estação, Grands Boulevards, onde aconteceu algo ultra, mega sinistro comigo. Logo no momento que o trem estava parando, uma explosão enorme, de dar medo.
No reflexo olhei para a frente e vi uma bola de fogo avançando do lado de fora no vagão da frente e muita, muita fumaça. Fudeu, é bomba de atentado terrorista !!! Gritaria e panico geral todo mundo, como se fosse uma ola de torcida organizada, se jogou no chão. Por frieza ou por lerdeza, instintivamente, fiquei do mesmo jeito que estava e apenas dei uma flexionada nos joelhos como quando agente se prepara para correr ou toma um susto. Numa fração de segundos pensei em duas coisas: 1° a sensação fodissima de estar sendo vitima de um atentado a bomba, medo e 2° percebi que o efeito da bomba não tinha chego até mim e que eu não tinha morrido.
No desespero tentamos abrir a porta como sempre fazemos, apertando o botãosinho (aqui na maioria dos trens a abertura é feita pelo passageiro) mas elas estavam travadas e com o empurra empurra para sair (nesta hora se você vacilar sobrevive a bomba mas morre pisoteado) somado ao pânico ninguém lembra da porra da chave de emergência, mas alguém berrou este procedimento e conseguimos abrir. Juro para vocês, quando a porta abriu não foram seres humanos que sairam daquele vagão, foram elefantes insanos. Ninguém quis saber de nada além de gritar e correr. O tenista deixou a raquete no caminho, a velhinha coitada, foi a primeira a cair e os que vinham atras dela pareciam dominos tropeçando sobre ela e nela. Imaginem que tava num trem de 4 vagoes com 16 portas se abrindo ao mesmo tempo, a manada de loucos tava enorme mas o que mais assustava era a gritaria misturada com a fumaça e a duvida de se alguém tinha morrido.
Eu sempre tive vontade de ser heroi e neste dia percebi que eu levo jeito para isso pois enquanto todo mundo corria, parei para ajudar a vovo a se levantar, depois peguei a raquete do garoto meio que com a intenção de entrega-la, afinal ele estava perto de mim, mas o muleque correu tão rapido que no curto tempo de abaixar, pegar a raquete e olha para a fente para entrega-lo ele tinha sumido e creio que verei ele nos 100 mts de Pekim este ano.
Empolgado com o momento heroi, fui em direção a fumaça mas logo caiu a fixa de que uma outra explosão poderia acontecer e resolvi mudar a direçao e recuar. Na mesma hora saindo do meio da névoa, veio um funcionario do metro, creio que o maquinista, pedir para que deixassemos o lugar (como se precisasse). No caminho para a rua, so ouvi choro e pessoas desmaiadas e outras tentando se acalmar. Ja do lado de fora, curiosamente, a primeira coisa que todo mundo fez foi pegar o telefone e ligar para alguém e contar o que aconteceu.
A caminho do trabalho ao som de sirenes e com vai e vem de ambulâncias, minha cabeça estava cheia de pensamentos: o azar de estar naquele lugar que nunca estou normalmente, o perigo de estar num pais que tem tropas no Afeganistão e que sofre com ameaças de bomba diariamente, as imagens, as pessoas e suas reações, as minhas reações e principalmente a forte lembrança do pavor de estar sendo vitima de um atentado, esta sensação, nunca esquecerei.
No trabalho, depois de contar a historia, meu colega espanhol disse que um dia antes tinha sido o aniversario do atentado de Madri, 11/03.
A noite apos o trabalho, voltei a estação para entregar a raquete no achados e perdidos. Aproveitei para perguntar a funcionaria o que tinha acontecido. Ela disse que foi realmente um grande problema mas de origem técnica, nada além de uma explosão de curto circuito. Sem vitimas, sem feridos sem bombas. Como o metrô de Paris tem mais de 100 anos, as instalações elétricas estão velhas e ultrapassadas e os curtos circuitos são frequentes e neste caso, um grande curto circuito tinha ocorrido.
Durante a noite e o dia seguinte, procurei noticias pelos jornais e internet e não encontrei nenhuma linha dedicada ao assunto, ou seja, a maior explosão que eu ja vi não foi nada.